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Nova entrevista com a autora: Cristina Serra

Atualizado: 21 de mar. de 2023

A jornalista e escritora Cristina Serra, autora do livro lançado em 2019 Tragédia em Mariana - A história do maior desastre ambiental do Brasil lança um novo livro, uma coletânea de crônicas publicadas na Folha de São Paulo, chamado Nós, Sobreviventes do Ódio - Crônicas de um País Devastado

Cristina Serra

Foi realizada em 2019 com a jornalista Cristina Serra, profissional da informação com mais de 30 anos de experiência como repórter de campo de vários veículos de imprensa (trabalhou mais de duas décadas nas Organizações Globo).

Cristina há três anos escreve uma coluna permanente no jornal Folha de São Paulo, e esse material compilado resultou agora, em 2023, na publicação de um livro cujo título é Nós, Sobreviventes do Ódio, publicado pela editora Máquina de Livros.

A coletânea de crônicas expõe seu olhar crítico ante todo o caos sócio-político da nefasta era Bolsonaro.

Ela volta gentilmente a falar conosco, expondo sua visão do governo passado e sua expectativa ante o atual governo Lula, particularmente sobre o momento climático que vivemos e que faz parte de suas inquietações como cidadã, nas esferas nacional e mundial, tema tão caro aos que se preocupam com o planeta.


1) Cristina, nós vivemos talvez a experiência do pior governo de toda a história brasileira, eu digo talvez porque os governos militares, que nos impingiram seus milagres econômicos tiveram, além do descaso com os mais pobres, a tortura como marca violenta imposta principalmente aqueles que se contrapuseram de maneira explícita à censura e às repressões estabelecidas. O que você pensa sobre isso?


Penso que nenhum período na história contemporânea brasileira foi pior que a ditadura iniciada com o golpe de 1964, com seu trágico legado de assassinatos, tortura, prisões arbitrárias, perseguições e violências de todo tipo contra opositores, além de corrupção, concentração de renda e aprofundamento de desigualdades. Mas, sem dúvida, em se tratando de um governo eleito, Bolsonaro ganha o título de pior governo da História e por diversas razões. Ele é um herdeiro dos porões da ditadura, da chamada “linha dura”, tanto que seu herói é Brilhante Ustra, sabidamente um dos torturadores mais bestiais de que se tem notícia. Seu comportamento, ações e omissões durante a pandemia resultaram numa carnificina: cerca de 700 mil brasileiros mortos. Seus ataques constantes à democracia e às instituições são outra forma de violência contra a sociedade brasileira. Por tudo isso e muito mais, Bolsonaro foi o pior governo da História do Brasil em tempos de vigência do regime democrático.


2) Dentro do que você explanou, e eu tendo a concordar integralmente, o que o governo de Jair Bolsonaro deixa como legado e ao mesmo tempo como alerta para nossos políticos e para nossa sociedade civil?


Bolsonaro conseguiu despertar e aglutinar as forças da extrema direita no Brasil e vimos isso da pior forma possível na explosão de violência do dia 8 de janeiro de 2023, apenas uma semana após a posse de Lula. Esse é o sinal mais evidente de que a extrema direita, de forte orientação fascista, veio pra ficar no Brasil. Combatê-la vai ser um trabalho de várias gerações.


3) O desastre de Mariana se deu em 2015, no governo Dilma Rousseff, e sobre ele você publicou um livro, em 2018. A tragédia de Brumadinho ocorreu em janeiro de 2019, no governo Bolsonaro. Dentro do que você investigou, há alguma catástrofe iminente para a qual você queira chamar a atenção do governo Lula?


Acho que a catástrofe que deve mobilizar toda a sociedade são os extremos climáticos, que já estão acontecendo e tendem a piorar se nós não fizermos nada. E quando falo “nós” estou falando de governo federal, estaduais, municipais, sociedade civil, universidades, ongs etc. É urgente modificar nosso padrão de consumo, mudar a matriz energética da economia, mudar a maneira como comemos e nos locomovemos. Sobre os desastres de mineração, há dezenas de barragens de rejeitos em Minas Gerais em situação de risco, ameaçando a vida de trabalhadores e comunidades. A sociedade precisa cobrar das autoridades competentes, federais e estaduais, a solução para essas bombas-relógio.


4) No cerne da questão climática, temos ambiguidades que mascaram uma hipocrisia, pois ao mesmo tempo em que os USA voltaram ao acordo de Paris e prometem 100% da frota de carros de passeio movida à eletricidade até 2050 e falam na necessidade de energia limpa, temos a indústria bélica fomentada em boa parte pelos próprios, pela quase necessidade imperiosa de haver conflitos. Os pequenos conflitos tem um alcance restrito em termos de lucratividade para os senhores das armas. Uma terceira Guerra poderia ser uma fonte de renda certa, mas você acha que o planeta sobrevive a uma guerra atômica?


O planeta sobreviveria porque a natureza tem uma imensa capacidade de regeneração. Mas a espécie humana, não. Na hipótese terrível de uma guerra nuclear, nós viraríamos cinzas em questão de minutos. Mas volto a dizer que a outra ameaça que precisamos enfrentar, pois ainda há tempo, é descarbonizar a economia para que possamos evitar o aumento da temperatura na Terra e para que as futuras gerações tenham alguma chance de sobreviver nesse planeta ainda cheio de maravilhas. Claro que isso só será possível se os Estados Unidos e a China entrarem pra valer na descarbonização. Caso contrário, a catástrofe climática será inevitável.


5) O Brasil, dentro desse “War” sócio-político, parecia estar stand by, com o governo Bolsonaro incapaz de marcar posições que fossem levadas em conta. Você vê algo diferente disso no governo Lula?


A diferença fundamental é que Lula tem credibilidade internacional. É uma voz respeitada e tem apontado o único caminho possível e justo para a solução do conflito na Ucrânia que é a paz. É preciso construir uma cultura de paz, como Lula vem falando.


6) O livro que você está lançando é fruto de trabalho árduo de ponderações intelectuais, jornalismo investigativo e de opinião, chama-se “Nós, Sobreviventes do Ódio”. Quem são esses sobreviventes? Esse ódio tornou-se atávico? Você imagina que se dissipe ao longo dos anos? Será que estamos imunizados diante dos quatro anos do governo que se foi? Lula disse que Bolsonaro não volta a governar o país. Será?


Nós somos os sobreviventes do ódio que Bolsonaro semeou, incentivou e estimulou durante quatro anos. Nós sobrevivemos e o derrotamos nas urnas. Foi tanto ódio semeado que ele está por aí e explode, de vez em quando, em episódios como o 8 de janeiro. O trabalho árduo de todos nós será semear a cultura de paz, civilidade e respeito à divergência também aqui dentro. Quanto a Bolsonaro, o que espero é que ele volte ao Brasil, seja investigado, processado e, de preferência, condenado e preso. A cadeia é o único lugar apropriado para Bolsonaro, sendo ele o bandido que é.


7) Nos deixe por favor uma mensagem de esperança, a sua esperança crítica.


Tenho imensa esperança no Brasil. Ao derrotar Bolsonaro, a população brasileira reafirmou seu compromisso com a democracia. Não tenho a menor dúvida que o destino do Brasil é ser um país democrático e inclusivo. Por isso mesmo, dedico o meu livro aos 700 mil brasileiros mortos pela Covid, como uma homenagem, e ao povo brasileiro que derrotou o fascismo nas urnas, como um modesto agradecimento. Foi esse gesto nas urnas que fez com que nós sobrevivêssemos ao ódio. Nós não apenas sobrevivemos. Nós vencemos.


Pergunta Bônus:

Essa pergunta foi a sétima de nossa primeira entrevista, em 2019. Você faria alguma revisão?


7) Seu primeiro livro Tragédia em Mariana – A história do maior desastre ambiental do Brasil é uma espécie de antecipação da tragédia anunciada de Brumadinho e de outras possíveis continuações; o que acha que faltou para que se evitasse as duas primeiras, isso tem partido ou ideologia a seu ver?

Acho que nada tem a ver com partido ou ideologia. Tem a ver com a maneira como as coisas são feitas no Brasil desde sempre, que é o conluio entre o poder público e os grandes conglomerados econômicos. O poder público finge que fiscaliza e a empresa faz o que bem entende. É simples assim. Aconteceu em Mariana, com a Samarco. Aconteceu em Brumadinho, com a Vale. E temo que ainda possa acontecer novamente, se as coisas não mudarem.


Não mudaria uma vírgula. No setor de mineração, continua tudo igual.

Nós, Sobreviventes do Ódio
  • Nós, Sobreviventes do Ódio - Crônicas de um País Devastado

  • Autora: Cristina Serra

  • Editora Máquina de Livros

  • 248 páginas


Lançamento em Belém do Pará, terra natal de Cristina: dia, 14/03, Palácio Faciola,

a partir das 18:30 h.

Lançamento em São Paulo: dia, 20/03, na Livraria da Vila, Rua Fradique Coutinho, a partir das 18:30 h.




Obra já à venda nas principais plataformas de vendas de livros

Contato da autora: @cristinaserra

Contato da editora: @maquina.de.livros

 

Imagem da autora: cedida gentilmente

Imagem do livro: internet


Entrevista concedida ao blog Anfetamina Dialética via email.

Agradecimentos fraternos à autora

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