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Foto do escritoranfetaminadialetica

O cortejo do pássaro

Atualizado: 7 de jan. de 2022

Um poema inédito que fará parte de Poemas Proscritos e nada exemplares

Pássaros - pintura inspirada em M. C. Escher

O pássaro recolhe suas cinzas

pousadas no autorretrato

não tem pressa

hoje e amanhã ele termina

a obra inacabada em voo


Para depois do esquecimento

para depois de amputada a memória

ele lembrará dos périplos

rotas de fuga, da natureza dos minérios


Golpeado na cerviz, exposto ao próprio âmago

a si mesmo ele revelará suas penas, seu martírio

de traçar o trajeto como um cego

percorre a volta com o tato analfabeto


Depois de morto, será amante dos fenícios

íntimo dos gregos e egípcios

como fênix do avesso ressuscitará

brotando da terra desalmada, seca, agreste

virá como cortesão dos labirintos

encontrará nas mãos de Sísifo

o de comer, onde pousará as asas cansadas

(mas em algum momento partirá

em busca do fígado de Prometeu)


Talvez leve seu corpo frágil aos lábios exangues de Maria

volver-se-á aos espelhos, em busca

de reflexo que o defina

mas será em seu cortejo, assim, grua alta

sob imagens invertidas, que recompor-se-á

pássaro sem asas, homem sem casa,

mulher sem nádegas


Os sóis encarcerados da cidade hão de deixar

entrever a carne solta da ave, pronta a revoar

pois em seu vulto, vulgo inspecionável

há um poço, um mistério, uma inalterada

imagem de pássaro morrente

reticente e circunspecta saindo dele


Waldir Barbosa Jr.

@anfetaminadialetica


Esse poema fará parte de Poemas Proscritos e nada exemplares, que será lançado em breve, no Clube de Autores.


Imagem: Pássaros - pintura anônima inspirada em M. C. Escher (internet)

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